Quadro, escultura ou as duas coisas? A edição de hoje traz a obra Forêt (2023) da artista francesa Eva Jospin (1975). Com formação em arquitetura pela École Nationale Supérieure des Beaux-Arts de Paris, Eva começou a se destacar na cena artística por volta de 2010, quando começou um trabalho considerado inovador devido ao uso de materiais cotidianos, e atualmente é uma das artistas mais celebradas da arte contemporânea francesa.
O trabalho de Jospin é fortemente inspirado pela natureza, especialmente florestas e paisagens naturais. Através do uso de materiais cotidianos mais acessíveis, como linha, madeira e principalmente papelão, ela cria esculturas e painéis de grande escala. Em sua maioria, as obras são tridimensionais, exploram a ideia de ambientes imersivos e a interação entre o natural e o artificial, e convidam os espectadores a se perderem em um mundo de fantasia e contemplação, ao mesmo tempo em que refletem sobre a relação entre o homem e a natureza.
Forêt (2023) é uma típica obra de Eva Jospin. Consiste num painel escultural de grande dimensão (medindo 170 x 240 x 36 cm), feito de papelão e madeira, que reflete uma floresta densa e imersiva, de camadas detalhadas, que borram a linha entre o natural e o artificial. Uma obra que convida os espectadores a refletirem sobre a beleza e a fragilidade da natureza, ao mesmo tempo que demonstra o excepcional artesanato e a visão imaginativa de Jospin.
📄 Mudando de assunto…
No dia 20 de julho, comemoramos o Dia do Amigo no Brasil, e no dia 30, o Dia Internacional da Amizade. Em homenagem a essas datas especiais, destacamos algumas das amizades mais inspiradoras, desafiadoras, problemáticas e produtivas da história da arte. As grandes amizades desempenham um papel crucial na definição de quem somos ao longo de nossas jornadas.
Andy Warhol e Jean-Michel Basquiat
A amizade entre a lenda da Pop Art, Andy Warhol (1928-1987), e o jovem artista selvagem Jean-Michel Basquiat (1960-1988), definiu o mundo da arte na Nova York dos anos 80. Juntos, criaram quase 200 obras em colaboração. A amizade começou em um almoço em 1982 e, desde então, tornaram-se inseparáveis, alimentando-se mutuamente em busca de fama, inspiração e companheirismo. Warhol introduziu sua técnica de serigrafia, enquanto Basquiat acrescentava seus icônicos rabiscos e imagens visuais.
No entanto, seus esforços combinados não foram bem-sucedidos comercialmente, o que prejudicou sua amizade. Após complicações de uma cirurgia que resultou na morte de Warhol em 1987, a depressão e o uso de drogas de Basquiat se descontrolaram, levando à sua morte um ano depois, em 1988.
A obra Dos Cabezas de Basquiat, baseada em uma das Polaroids tiradas por Warhol durante seu primeiro encontro, foi pintada poucas horas após o evento e apresentada a Warhol ainda úmida. Em 2010, foi vendida pela Christie’s por U$7.82 milhões. A partir desse mesmo encontro, Warhol criou vários retratos de Basquiat, elevando-o à sua lista de ícones Pop do século XX. Utilizando uma técnica única que incluía a oxidação do metal através de urina, um desses retratos foi leiloado pela Christie’s em 2021 por U$40 milhões.
Neste livro você encontra mais sobre essa intrigante amizade: Warhol on Basquiat: The Iconic Relationship Told in Andy Warhol’s Words and Pictures. Não achamos a versão em português.
Para saber mais: Andy Warhol e Jean-Michel Basquiat.
Francis Bacon e Lucian Freud
A amizade entre Francis Bacon (1909-1992) e Lucian Freud (1922-2011), que começou em 1945, foi uma das mais intensas e influentes na história da arte. Eles rapidamente se tornaram próximos, compartilhando uma vida social vibrante e trocando influências artísticas significativas. Bacon, com seu estilo expressivo e chocante, incentivou Freud a experimentar novas técnicas, enquanto Freud, com seu detalhismo meticuloso, influenciou Bacon a considerar diferentes aspectos da figura humana. Ambos retrataram um ao outro em suas obras, com Freud criando vários retratos de Bacon e Bacon realizando estudos de Freud, refletindo a intensidade de sua relação.
Apesar da profunda admiração mútua, a amizade começou a se deteriorar nos anos 1970 devido a divergências pessoais e artísticas. Bacon via Freud como excessivamente tradicional, enquanto Freud criticava a repetitividade nas obras de Bacon. Esta rivalidade crescente levou ao afastamento, mas a amizade e a subsequente competição entre os dois deixaram um impacto duradouro na arte contemporânea.
Na pintura de Bacon por Freud, o único retrato a óleo sobrevivente que o artista pintou do amigo, podemos perceber o estilo de Freud na construção da imagem através de pinceladas marcadas, apesar da obra ser inacabada. Foi vendida pela Christie’s em 2008 por GBP 5.4 milhões.
Em contrapartida, Bacon fez diversos trabalhos usando o amigo como tema. Usando seu estilo expressionista surreal, pinta Freud com pinceladas em movimentos soltos a distorcer a fisionomia, seu objetivo é o impacto psicológico no observador.
Para saber mais: Francis Bacon e Lucian Freud.
Paul Gauguin e Vincent van Gogh
A amizade entre Vincent van Gogh e Paul Gauguin foi marcada por admiração mútua e atividades artísticas compartilhadas, mas também por intensas dificuldades e conflitos.
Van Gogh e Gauguin se conheceram em Paris, em novembro de 1887. Em maio de 1888, Van Gogh alugou quatro quartos em uma casa em Arles, no sul da França, conhecida como "A Casa Amarela". Admirando o trabalho de Gauguin, Van Gogh o convidou para se juntar a ele. Gauguin aceitou o convite, e os dois artistas passaram nove semanas intensas pintando juntos, trocando ideias e estilos, bebendo absinto e conversando até altas horas da noite. Van Gogh foi fortemente influenciado pelas cores ousadas e formas simplificadas de Gauguin, enquanto Gauguin apreciava a paixão e a técnica de Van Gogh.
No entanto, a convivência revelou profundas diferenças em suas personalidades e abordagens artísticas, levando a tensões constantes. Van Gogh sonhava em transformar Arles em uma comunidade artística, ideia que Gauguin detestava. Frequentemente entravam em conflito sobre suas diferentes ideologias, causando debates turbulentos. Gauguin acreditava que a arte deveria ser criada a partir da imaginação, enquanto Van Gogh defendia que a inspiração devia vir da natureza.
A amizade culminou em um famoso incidente em dezembro de 1888, quando, após uma briga acalorada, Van Gogh cortou parte de sua própria orelha, em meio a um colapso nervoso. Após esse evento, Gauguin deixou Arles.
Acima, a pintura de Gauguin, feita em outubro/novembro de 1988, mostra o amigo trabalhando, na Casa Amarela. Sabemos que o uso de girassóis como modelo vivo era impossível, assim Gauguin está retratando a essência do amigo em vez de um momento real. Em dezembro do mesmo ano, Van Gogh pintou o retrato de Gauguin utilizando camadas grossas de tinta e cores contrastantes. Nesta obra, Gauguin aparece de costas, também pintando na Casa Amarela. A posição de Gauguin sugere que Van Gogh o estava observando enquanto trabalhava.
Para saber mais: Vicent Van Gogh, Paul Gauguin.
Édouard Manet e Berthe Morisot
Berthe Morisot (1841-1895) conheceu Édouard Manet (1832-1883) em 1867, através do pintor Henri Fantin-Latour. Morisot se tornou a primeira mulher impressionista, integrando o grupo ao lado de amigos como Monet, Renoir, Degas e Pissarro. Em 1874, ela se casou com o irmão de Manet.
A amizade entre Morisot e Manet se desenvolveu em uma forte afeição e respeito artístico mútuo. Inicialmente, Manet atuava como mentor, mas ambos influenciaram os estilos um do outro. Morisot, respeitada como par e musa, foi retratada diversas vezes por Manet. A intensa conexão e o diálogo artístico entre eles eram estimulantes, e a competição saudável entre suas obras enriquecia suas criações. Morisot era uma artista determinada e independente, o que ocasionalmente tumultuava sua amizade com o confiante Manet. No entanto, esses desafios eram instigantes e inspiradores para ambos. Manet manteve três pinturas de Morisot em seu quarto, e até hoje, especula-se sobre a natureza de seu relacionamento.
Este retrato de Berthe Morisot foi executado por Manet diferentemente de seus outros retratos. Ele colocou metade do rosto de Morisot na sombra e a outra metade iluminada, criando um contraste que transmite intensidade e atrai o olhar do observador para o rosto dela. Morisot está vestida com roupas sóbrias e segura um buquê de violetas, executado em baixo contraste para que o foco no rosto não fosse perdido. Alguns críticos consideram esta obra como uma das maiores pinturas de Manet.
Para saber mais: Édouard Manet e Berthe Morisot
Se você gostou, sugerimos o livro: Carta de los artistas: De Leonardo da Vinci a David Hockney, de Michael Bird, que trata sobre o tema da amizade por meio das cartas trocadas entre artistas, revelando uma comunidade criativa de pares artísticos que, com apoio e apreciação, desmistificam o artista solitário. O livro possui alguns dos artistas que mencionamos aqui. Ainda não há tradução para o português.
👀 Arte em Pauta
O fóssil mais caro do mundo foi vendido por quase U$45 milhões esta semana pela Sotheby’s.
Uma escultura Crowning, da artista austríaca Esther Strauss, foi vandalizada em exibição na catedral de Linz, na Áustria. A peça retrata Maria dando à luz, e mesmo com a “benção” da igreja, os mais extremistas não gostaram.
Rio de Janeiro tem a primeira galeria no Brasil de criptoativos e arte digital.
A exposição Calder + Miró, no Instituto Tomie Ohtake, em São Paulo, vai até 15 de setembro e está imperdível.
Gosta de unir arte e gastronomia? Aqui tem uma lista de locais em São Paulo onde é possível fazer isso.
Interessante o trabalho de Eva Jospin.
Chama-me atenção o fato dela usar madeira e papelão e outros materiais muito relacionados ao feminino, ao corriqueiro, ao banal. Ela usa o papelão que é parente do papel, portanto, foi árvore e madeira. E nós, escrevemos e usamos também papel que é árvore e madeira e foi floresta.
Caberá ao feminino o retorno ao natural, ao intuitivo?!
Ao que parece, sim.
Obrigada pela edição!
Achei bem interessante a obra da Eva Jospin